Ficam aqui dois poemas de Alberto Caeiro, de "O Guardador de Rebanhos", respectivamente os poemas XIX e XXXV.
O luar quando bate na relva
Não sei que cousa me lembra...
Lembra-me a voz da criada velha
Contando-me contos de fadas.
E de como Nossa Senhora vestida de mendiga
Andava à noite nas estradas
Socorrendo as crianças maltratadas ...
Se eu já não posso crer que isso é verdade,
Para que bate o luar na relva?
O Luar através dos altos ramos
O luar através dos altos ramos,
Dizem os poetas todos que ele é mais
Que o luar através dos altos ramos.
Mas para mim, que não sei o que penso,
O que o luar através dos altos ramos
É, além de ser
O luar através dos altos ramos,
É não ser mais
Que o luar através dos altos ramos.
anteontem foi Lua-Cheia, a 2ª de Janeiro (uma raridade)
2 comentários:
Caeiro, Àlvaro de Campos, Pessoa, são inexcedíveis.
Mas se de luar de Janeiro falamos, então parece-me ser de aqui trazer também um poema dedicado ao luar do mês que passou:
'Luar de Janeiro'
Augusto Gil - 1909
(na grafia original)
Luar de Janeiro,
Fria claridade
Á luz delle foi talvez
Que primeiro
A bocca dum português
Disse a palavra saudade...
Luar de platina,
Luar que allumia
Mas que não aquece,
Photographia
D'alegre menina
Que ha muitos annos já... envelhecesse.
Luar de janeiro,
O gelo tornado
Luminosidade...
Rosa sem cheiro,
Amor passado
De que ficasse apenas a amizade...
Luar das nevadas,
Algido e lindo,
Janellas fechadas,
Fechadas as portas,
E elle fulgindo,
Limpido e lindo,
Como boquinhas de creanças mortas,
Na morte geladas
-E ainda sorrindo...
Luar de janeiro,
Luzente candeia
De quem não tem nada,
-Nem o calor dum brazeiro,
Nem pão duro para a ceia,
Nem uma pobre morada...
Luar dos poetas e dos miseraveis,
Como se um laço estreito nos unisse,
São similhaveis
O nosso mau destino e o que tens...
De nós, da nossa dôr, a turba - ri-se
-E a ti, sagrado luar ... ladram-te os cães!
Por acaso, surpreendeu-me ver a lua cheia anteontem na Foz. Fui jantar à Mascara ( lembras-te?) e de repente dei de caras com uma lua enorme e sorridente a iluminar os rochedos e o mar de esguelha. Fiquei pasmada pois é raro estar claro no inverno e só vejo luas minguantes ou crescentes pequeninas. Os poemas são bonitos, mas luar é ouvir a sonata de Beethoven ou a de Debussy, ambas lindíssimas. Dizem-me mais, talvez.
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