quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Lisboa que amanhece


Sérgio Godinho é uma pessoa muito interessante. Quando escrevo "pessoa" é porque não é apenas um cantor. É também um poeta, um diseur, um músico, e um homem que sabe abraçar causas e que sabido actualizar a sua mensagem e evoluído nos sons, experimentando novas variações , também, associando-se a novos músicos, promovendo-os.

Humilde e simpático em palco, Sérgio Godinho tem uma enorme discografia - pessoalmente, prefiro as suas músicas românticas, que são muitas, e nas quais o poeta disseca as peripécias, sucessos e tristezas do Amor. Este "Lisboa que amanhece", pelo ritmo do poema e pela letra e música, é um dos meus preferidos.

7 comentários:

Virginia disse...

Nunca apreciei o Sergio Godinho. A voz dele irrita-me sempre e não consigo gostar , nem das letras, nem das melodias. Deve ser mesmo algo genético que desenvolvi contra o homem. Sei que há pessoas que o apreciam imenso, sobretudo em Lisboa, mas não consigo simpatizar sequer com ele.E não gosto de canções de protesto. Gostava nos anos sessenta, agora cheiram-me a deja vu e entendu. Mea culpa. Há poucos cantores portugueses que me atraiam. Deve ser da língua.

miguel disse...

A opinião que tenho da obra do Sérgio é tão convicta como a da Virgínia, mas rigorosamente de sinal contrário.

Acho que sérgio Godinho é um compositor fecundo, autor de músicas belíssimas e um poeta que escreveu poemas de poeta GRANDE.

Acho também que Sérgio não é um cantautor de intervenção, no sentido redutor do termo: questiona, sim, as coisas, e faz muito apelo à nossa sensibilidade -na relação com o outro e com as coisas.

Esta " Lisboa que Amanhece " é leve, bela, pura e entra, simultaneamente, por caminhos da contemporeneidade musical, sem destoar, bem antes pelo contrário.

Virgínia: a poesia do Sérgio é, do meu ponto de vista, indissociavel da sua música - devia merecer, inclusive, honras de transcrição nesta entrada, sugestão que, desde já, deixo ao editor.

E Virgínia: Sérgio godinho é do " seu " Porto, cidade de talentos artísticos que gerou, seguramente, 70% dos grandes nomes da música - dita - ligeira portuguesa dos últimos 40 anos . Ex: Táxi; GNR e Rui Reininho; Sérgio Godinho; Pedro Abrunhosa; Clã e mais , muitos mais, que agora me escapam.

Sérgio - um nome que roça a dimensão - sem ultrapassar - de um outro , de GÉNIO, como há poucos: José Afonso.

Virginia disse...

Miguel: agradeço o esclarecimento tão completo sobre o cantor e vou tentar - já tentei mesmo muito, desde os anos 70 - empatizar com a música dele. Quanto à poesia, acredito que seja bela, mas como não gosto da sua voz, nunca ouvi muito mais que 10 minutos das suas canções, nem o ouvi ao vivo.
O facto de ser do Porto - é certo que gosto da cidade - não me afecta muito, pois não gosto especialmente de nenhuma das bandas citadas e acrescento outro que acho um meloso: Rui Veloso ( até rima!). Não suporto o homem....
Sei que estou a ser radical, mas a língua portuguesa cantada, só aguento as dos Zeca Afonso, Adriano e coimbrões, fadistas consagrados: Amália ( em doses temperadas), João Braga, Camané, Mafalda Arnauth, Ana Moura , e canções tradicionais como a morna, o mandó, etc.
Talvez tenha tido demasiada influencia anglo-saxonica e francesa na juventude....até prefiro o alemão ao português cantado.
A musica coral em portugues fica péssima. E nós cantávamos no coro dos Jerónimos, obras como o Halleluja do Messias!

mas dou o benefício da dúvida....

PS. Já viu a entrada do meu blogue : O Professor? Penso que lhe interessará muito!

miguel disse...

Virgínia,

Já tinha lido a sua entrada " O Professor ", sim.

Fiquei curioso prque há poucos relatos da experiência vivida do que é ser docente, aqui ou em qualquer outro lado.

Mário disse...

Eu admiro muito o Godinho, pela sua simplicidade, pelo músico que é (tem melodias lindas) e pelas letras, a maioria feitas por ele. Tem dois livros de poemas muito bons, com uma grande capacidade de reflexão sobre a vida.
A fase "revolucionária" foi uma, e apenas uma da carreira dele, e perfeitamente sintonizada num determinado tempo histórico - neste momento (aliás, desde o iníci dos anos oitenta) que não escreve novos poemas de protesto, a não ser ironicamente um ou outro, como o "Presidente Capicua". Soube evoluir e tem sido um percursos de muitas formas de música.
É um poeta muito bom, e vou aproveitar a ideia do Miguel, de colocar aqui alguns poemas, para serem lidos enquanto tal, ultrapassando os "preconceitos políticos".

Mário disse...

Gosto muito deste: "Coisas do Amor - I)

As certezas do meu mais brilhante amor
vou acender, que amanhã não há luar
eu colherei do pirilampo um só fulgor
que me desculpe o bom bichinho de o roubar

Assobiando as melodias mais bonitas
e das cidades, descrevendo o que já vi
homens e faces e os seus gestos como escritas
do bem, do mal; a paz, a calma e o frenesi

Se estou sózinho, é num beco que me encontro
vou porta-a-porta, perguntando a quem me viu
se ali morei, se eu era o mesmo e em que ponto
o meu desejo fez as malas e fugiu

Assobiando a melodia mais bonita
a da certeza do meu mais brilhante amor
da sensação, dentre as demais, a favorita
que é ver a rosa, com o tempo, a ganhar cor

Assobiando as melodias mais brilhantes
como o brilhante da certeza de um amor
como o rubi mais precioso entre os restantes
que é o da meiguice alternando com o ardor

Não negarei ficar assim nesta beleza
assobiando as melodias mais fugazes
não é possível, nem é simples, com certeza
mas é a vontade que me dá do que me fazes.

R. disse...

Estas suas (duas) escolhas são, curiosamente, as minhas preferidas. E subscrevo-o incondicionalmente quando elogia as qualidades poéticas do Sérgio Godinho. É preciso ser poeta para dizer coisas tão sublimemente simples como estas: "em sonhos, é sabido, não se morre. Aliás, essa é a única vantagem"...